Maria rendeira.



" Quantas vezes a vida nos
revela que a saudade
da pessoa amada,é bem
melhor que a presença dela".
Mario Quintana.


Quantas e quantas noites Maria passou acordada esperando o seu amado.
Que numa tarde de outono pegou seu barco e entrou mar a dentro.
Então Maria resolveu tecer uma colcha de renda.Para o
tempo passar mais depressa
e a saudade doer mais devagar.

Eram pontos e mais pontos e a dor da solidão se escondia no rendar.
O povo não a via mais nas ruas.Seu rosto não era mais feliz.

Sorriso há muito não dava mais.Luz do olhar se apagou.Vida toda sem brilho.
As crianças não queriam mais dela se aproximar.Os amigos
se afastaram todos
e outros tantos a chamavam agora de Maria rendeira.Maria que rendava pra esquecer um grande amor.Maria que rendava pra ocultar a intensa dor.Anos e anos se passaram.Fios

feitos remendados e desfeitos pra serem recomeçados.A colcha era tão igual aquela saudade.Não terminava nunca.Fazia que acabava e começava de novo.Maria esquecera de si.Maria se perdera no vento da ilusão.Nem percebera que aquele amor não lhe bastava.Era tão pouco que mal lhe cabia no abraço.Aquele homem que um dia se foi nunca havia feito dela uma mulher de verdade.Mas apenas uma Maria que cumpria ordens.Recebia xingamentos e pouco afeto.Uma Maria que não tinha vida própria e que quem sabe agora termina a colcha e pela primeira vez tece a sua própria vida.


Comentários

Rodrigo disse…
Muitas vezes ficamos esperando alguém voltar, ou apenas pensando em uma pessoa, e deixamos de viver nossa própria vida. Muitas vezes já me vi nessa situação. Ah, sobre o comentário que fizeste sobre ter saudade de minha fase mais "apaixonada": não estou mais naquele estado de "desespero" por ela, mas continuo gostando. Mas estou também, como escreveste no poema, continuando a tecer minha própria vida. Beijos!
jardinière disse…
Obrigada, Lia, volte sempre ao meu jardim! Eu mesma tenho ido pouco cuidar dos canteiros, ou de qq coisa dessa blogosfera, mas prometo conferir seu "cotidiano" em breve, qdo voltar de viagem. Beijo e tudo de bom - J.
Henrique Luna disse…
Essa história é encantadora e ao mesmo tempo assustadora. Assustadora pq é real, extremamente verossímel... Quantas vezes vemos pessoas vivendo a vida de outras? Ou nós mesmo... Refaço essa pergunta pra mim mesmo. Sabe, Lia, acho que uma das piores coisas nessa vida é o "não se bastar", não gostar de si mesmo. Isso é tão sério... Faz com que não nos interessemos por nossa própria vida, mas há sempre a necessidade de buscar n@ outr@, de ver n@ outr@, de esperar @ outr@... Em fim, não ter vida própria é algo terrível. Lia e seus belos textos... levam a gente a uma verdadeira introspecção...

Grande beijo e um bom dia!
Lena disse…
Tem tantas Marias espalhadas por aí, minha amiga... Algumas pegaram as rédeas do destino e fizeram outra história, outras acostumaram-se a esperar... Bjo e boa tarde!
Laura_Diz disse…
A tua maria é a minha Penélope, já leu? é um poema que fiz sobre tecer e esperar. Dê uma lida.
está bonito este. bj laura