Um conto sem final .






" Era um conto muito velho,
que só queria acabar."
( Hebert Farias)


Suas lembranças já lhe vinham como sonhos.Primaveras passadas,verões maravilhosos
desfrutados ao lado da numerosa família.Eles eram bem tradicionais,e como tais,adoravam
reunir-se em todas as datas comemorativas.
O dia dos pais estava se aproximando:Eusébio e Tarsila decoravam os jarros com flores e
folhas fresquinhas do imenso jardim da mansão dos Albuquerques de Menezes.Também
pediram aos empregados que providenciassem novas cadeiras para a piscina,porque suas noras
e netas gostavam muito de banhar-se ao sol.O prato principal daquele dia estava ainda em discussão.Enquando Tarsila insistia em frutos do mar,Eusébio apostava no churrasco.
A ansiedade era muita.Os dois mal conseguiam dormir.Faltava bem menos do que uma semana.
O rosto de Tarsila estava iluminado,como há tempo Eusébio não o via.As almofadas que tinham
sido forradas contrastaram muito bem com aquela sala estilo Luís XV.Tudo perfeitamente organizado.Afinal os dois sempre receberam à alta sociedade carioca.Extremamente detalhistas
e cuidadosos.Temiam errar por exageros ou por faltas.
Tarsila e Eusébio tinham mais de cinquenta anos de casamento.Nunca se aborreciam um com o outro.Se conheciam apenas na maneira de falar,ou mesmo traduziam o olhar um do outro.Invejados pelos amigos e até por parentes.Porque a maioria dos seus parentes ou amigos já haviam se separado,ou andavam em crônica crise conjugal.Quando queriam dar um exemplo de casamento que deu certo:Eusébio e Tarsila.Eusébio com seu porte alto,a vida profissional dedicada à obras de artes requintadas,aposentou-se há bem menos de cinco anos.
Tarsila,violinista recolhecida em várias partes do mundo.Dedicava-se desde o nascimento do primeiro dos seus três filhos aos cuidados da mansão em que viviam em Botafogo.Herança dos
deixada pelos pais de Eusébio.Todos os seus sonhos de uma carreira internacional ,transforma-
ram-se em carinho e dedicação aos filhos:Leonardo,Pedro e David.Todos muito bem sucedidos
como empresários no Rio de Janeiro e já casados e com filhos.Ao todo eram cinco netos,entre meninos e meninas.Todos visitavam os pais e os avós com pouca frequência.Afinal eram muito
ocupados.As exigências sociais tomavam-lhes muito tempo.
Amanheceu um lindo Domingo de sol.O cardápio foi organizado pela cozinheira .Como sempre
acontecia,a opinião de Tarsila prevaleceu:um variado banquete com frutos do mar.A lagôsta era
o destaque no mesmo.Vinhos selecionados por Eusébio ,que sempre amou vinhos.Tudo estava
perfeitamente preparado.A espectativa era imensa.Nada poderia fugir ao controle dos dois.
Quase meio-dia,ninguém chegou.Tarsila estranhou o atraso.Procurou o número do celular do filho mais velho,pediu pra Eusébio ligar.Apreensiva,procura os números dos outros filhos.Nenhum deles atendeu.Depois de mais uma hora de espera.O empregado tem a idéia de
levar Eusébio até a cobertura onde mora o seu filho mais velho,porque nenhum dos telefones eram atendidos.Tarsila ficou em casa aguardando.
Ao chegar do prédio o porteiro abriu o portão, porque já conhecia o pai de Leonardo.Já dos primeiros andares já se podiam ouvir os ruídos de festa.A festa que estava acontecendo no
apartamento de Leonardo.A porta principal estava entre aberta,e do corredor mesmo Eusébio
avistou uma cena que jamais pensaria ver em toda a sua vida:uma grande comemoração do dia dos pais,com todos os seus filhos,noras,netos e amigos.Todos sorriam e se deliciavam num delicioso churrasco regado à muita cerveja e alegria.
Eusébio se retirou imediatamente do prédio,ordenando ao seu motorista que retornassem para
à mansão.Chegando lá ,Tarsila correu em sua direção exigindo uma explicação.
O marido lhe abraçou com um abraço que era um misto de carinho,compaixão e desespero.E
olhando fixamente nos olhos da mulher,sussurrou:__Eu bem que te avisei,meu bem.Deveríamos ter feito
um saboroso churrasco!!!

Comentários

Laura_Diz disse…
Triste, que horror. bj laura
Anônimo disse…
Lia, essa história faz a gente parar e refletir. É uma lição sobre encontros e desencontros entre as pessoas. Pena que termina num desencontro entre pais e filhos numa data importante. Beijo!
Henrique Luna disse…
Lia... fiquei com uma pena danada do Eusébio e da Tarsila... Um desencontro desses. Não foi só o fato da festança não ter rolado na mansão, mas eu acho que captei onde vc quis chegar. É verdade que num determinado momento os filhos criam asas, mas em muitas famílias esse vôo acaba indo longe demais. É uma pena.

Conta pra nós... Isso aí foi um fato verídico não foi?

Beijo grande
Santos Passos disse…
"Eusébio e Tarsila sentaram-se à mesa, serviram-se dos frutos do mar, Eusébio verteu vinho nas duas taças.
Brindaram trocando olhares cúmplices. Tarsila, sorriso solto, completou:
- Enfim sós."
Com esse final, fico mais contente.
Beijinhos.
Jôka P. disse…
Lia,
só agora pude passar...
Mas cheguei, viu ?
Adorei essa estória de Eusébio e Tarsila.
Forte, né ?
Gosto de histórias assim.
;O)
JÔKA P.
Anônimo disse…
Lia estou aqui novamente lendo suas coisas.
Ainda não mandei as fotos. Mas, estão chegando.
Liliane
Lena disse…
Menina, vc estás se saindo uma ótima escritora. Teu filho tem a quem puxar! rs Bjo e bom domingo.
Rodrigo disse…
Eu também achava que eles tinham que ter feito um churrasco. Com certeza os filhos queriam que o cardápio variasse um pouco. Muito bom esse conto. Beijos!
Anônimo disse…
Achei triste e muito doce seu conto. Há algo nele que fala dos nossos limites. Mas é lindo. Obrigada por sua visita lá nas minhas terras. Abs
Fred disse…
Emoções!
Só uma pessoa sensível como você pode proporcionar.
De garganta apertada te agradeço as palavras sempre generosas.
Abraços
Fred